A Secretaria da Agricultura aos 25 anos
Quando eu tive a certeza de
que não estava nos planos das duas forças políticas que disputavam o poder na
Redação do Estadão, me mandei.
Não adiantava ficar no jornal
da família Mesquita porque eu não passaria de um simples repórter.
Jamais teria chance de fazer
grandes coberturas, viagens internacionais, nem chegar a ser editor, como eu
tanto queria.
Aproveitei um convite do
empresário Pedro Tassinari Filho, que tinha mansão no Morumbi, em São Paulo, e
atividades produtivas em Orlândia, no Interior paulista, e fui com ele para a
Secretaria da Agricultura do Governo do Estado de São Paulo.
Tassinari era um homem
viajado e conhecia toda a região vinícola da França.
Cada conversa com ele a
respeito de vinhos era uma aula.
Foi na residência dele que
conheci a primeira adega particular e pessoal, totalmente climatizada.
Pedrinho, como diziam os
íntimos, era cunhado do deputado federal Sérgio Cardoso de Almeida, um aliado
dos militares de plantão, mas crítico ferrenho dos burocratas de Brasília.
Foi ele, Cardoso de Almeida,
quem me indicou a Tassinari.
Nos conhecíamos, Cardoso de
Almeida e eu, das reuniões mensais do Alto Conselho Agrícola, que me faz
lembrar com saudades do Pátio do Colégio, onde a Secretaria da Agricultura
funcionava quando comecei a acompanhar as atividades oficiais, políticas e
burocráticas do setor.
Pedi a Cardoso de Almeida que
me conseguisse uma entrevista exclusiva com Tassinari e no fim da conversa o
futuro secretário me disse que o deputado e cunhado havia recomendado que ele
me convidasse para assessorá-lo na Secretaria da Agricultura.
O governador escolhido pelos
militares era Paulo Egydio Martins, ex-ministro da Indústria e Comércio.
Aceitei, pedi licença do
Estadão e fui viver minha primeira experiência como assessor de imprensa e
servidor público.
Era início de 1975 e, segundo
nota publicada na Gazeta Mercantil, eu era o mais jovem chefe de uma unidade do
gênero no governo do Estado.
Eu tinha 25 anos e fora
nomeado chefe da Assessoria de Divulgação da Secretaria da Agricultura.
Nomeado, vírgula.
Eu fora guindado ao cargo
informalmente.
Tanto que passei três meses
sem receber salário e cheguei a pedir dinheiro emprestado a outros assessores –
Klaus Trench de Freitas e Miguel Argollo Ferrão Neto – para comprar leite para
minha filha pequena.
Coisa de gente inexperiente.
Só no dia 20 de maio de 1975
os burocratas da Secretaria da Agricultura arrumaram um jeito para me
oficializar.
Foi registrado como “Assessor
Técnico nível II” na Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São
Paulo) com o salário de R$ 10.000,00 (dez mil cruzeiros) por mês.
Pouco mais de um ano depois,
no dia 1º de setembro de 1976, eu fui desligado da empresa.
Havia tido um desentendimento
com o chefe de gabinete do secretário, Roberto Cano de Arruda, e resolvera
pedir demissão a Tassinari.
Como ele estava no Interior,
em viagem oficial, e não foi à Secretaria naquele dia, em fins de agosto de
1976, eu fui à casa dele, no Morumbi.
Quando chegou, ele estranhou
minha presença ali e me convidou para entrar.
Resumi o que havia
acontecido, ele tentou me convencer a ficar e eu disse que não tinha mais
estômago para ir todo dia à Secretaria, no Parque do Estado, junto ao
Zoológico, ao Jardim Botânico e ao Simba Safári, no extremo da zona sul da
capital paulista.
Ele pegou minha carta de
demissão e encerrou a conversa dizendo: “O Sérgio (Cardoso de Almeida) vai ficar
triste com a sua saída”.
Fui pra casa e fiquei dias
esperando pela carta em que Tassinari aceitava minha demissão e oficializava
minha saída.
Cláudia, com três anos e
meio, estranhou a presença diária do pai no apartamento de número 52 do
Edifício Dom Casmurro, na Rua Machado de Assis, 165, na divisa da Aclimação com
a Vila Mariana, e perguntou a razão à mãe.
Ao saber que eu havia saído
do emprego, a pequena nos surpreendeu com a seguinte pergunta: “E agora, mãe,
como nós vamos comprar comida?”
Digo, desde então, que minha
passagem pela Secretaria da Agricultura valeu como um curso de pós-graduação.
A graduação em Jornalismo eu
tinha feito nas redações do Jornal do Comércio de Marília e do Estadão.
A pós, em Jornalismo e outras
tantas atividades da vida, eu cursei nos meus 18 meses de Secretaria da
Agricultura.
Lá eu aprendi a conviver com
gente que vivia pensando em passar a perna no colega do lado para se garantir
no cargo e, se possível, subir na vida.
Lá eu vi como agiam os
repórteres interessados em distorcer informações para criar polêmicas e chamar
a atenção para o trabalho deles.
Lá eu conheci muita gente
boa, honesta, competente, solidária, pronta para ajudar a mim, que estava ainda
em início de carreira, e a muitos outros.
Lá eu tive a comprovação de
que as pessoas, em geral, são iguais a uma moeda: sempre tem dois lados (ou
duas caras, ou mais, no caso).
Tive muitas decepções ao
longo do meu ano e meio de Secretaria da Agricultura.
Mesmo assim, o saldo foi
positivo.
Altamente positivo.
Portanto, foi muito bom ter
passado pela Secretaria da Agricultura nos primeiros 18 meses da gestão de
Pedro Tassinari Filho como secretário e Paulo Egydio Martins como governador de
São Paulo.
Cláudio Amaral
19/12/2006 10:04:11 (em São Paulo)
e 06/06/2012 13:18:16 (em Ashburn Village, Virgínia, EUA)
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